O estranho pão de ervilhas



Quando ouvimos falar do coronavírus, estávamos preparando um canteiro para plantar ervilhas-tortas (Pisum sativum var. saccharatum). As informações eram ainda mais confusas do que agora. A sensação foi de um cerco. Ele continua.

A ervilha é mencionada na Bíblia em referência ao cerco de Jerusalém. Os pecados se avolumavam entre o povo escolhido. Desprezo à vida, traição, difamações, avidez por lucro, abusos, exploração, racismo, idolatria, sacrifício de crianças, escravidão, adultério, fé hipócrita, assassinatos, roubo, sábado quebrado. Misericordiosamente, Deus enviou profetas para chamar o povo à razão, abrir seus olhos, despertá-lo do mal.  Todo pecado pode ser perdoado, desde que haja sincero pedido de perdão e vida transformada pelo sangue de Cristo. Sem confissão e restituição, Deus exerce justiça. Crime e castigo.

A ordem do Senhor ao profeta Ezequiel ilustra a maligna resposta do povo ao chamado divino. Ezequiel deveria se deitar do lado esquerdo e depois do seu lado direito por 390 dias, nos quais comeria diariamente quatro pãezinhos e beberia dois copos de água, bem devagar. Além de serem feitos com aveia, lentilha, trigo e cevada, os pães continham ervilhas. Para completar a receita, deveriam ser assados na brasa proveniente de fezes humanas. A carestia de alimentos e a imundície das fezes simbolizavam o fim. Eram, também, uma maneira de despertar o paladar e o olfato, mover os sentidos.

O pão de ervilhas de Ezequiel é uma receita de comida triste. Lamentações. Por outro lado, se estivesse atento, o povo poderia ter visto na vida do profeta e em seu pão de dores a oportunidade para retroceder de seus caminhos maus, escapar do cerco do inimigo. Os pães de ervilhas, por si sós nutritivos, eram um chamado desesperado de amor. Voltem, por favor. Não fiquem sem pão ou sem água, em desespero. Não morram por causa de seus pecados (Ezequiel 4).

Cultivamos, aqui no sítio, nossas ervilhas em meio às apreensões de um confinamento ou isolamento inédito pelo qual o mundo passa. Cada sementinha depositada na terra por um menino representou delicadeza, vida. Os meses passaram como que cobertos de varas e fios entrecruzados numa tessitura caótica à semelhança do que fizemos na horta para dar suporte à planta. Brotaram, cresceram e vieram as flores. Então, despontaram as pequenas vagens recheadas de ervilhas. O menino colheu, eu as cozinhei. Tivemos boas refeições com ervilhas-tortas da horta à frente de casa, em meio ao cerco que caiu sobre todos. Vimos muitas flores roxeadas perpassadas pelos raios frios do inverno, ao cair da tarde.

Foi a primeira vez que plantamos ervilhas-tortas. Descobrimos que são ricas em proteínas; que contêm sativin (Veja aqui), proteína capaz de matar fungos resistentes; que contêm lectina, que de maneira impressionante pode inibir o vírus HIV (Veja aqui). Quem diria?

O pão de ervilhas era, afinal, alimento e remédio; um grito do alto para quem já não sentia fome de Cristo. Um clamor sem resposta.  



        







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